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Lilico na capa de seu disco: De Bangu, Realengo , Padre Miguel |
#Realengo200 anos
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Lilico na capa de seu disco: De Bangu, Realengo , Padre Miguel |
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Olívio Henrique Fortes |
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O homen do Bumbo "A praça é nossa". |
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Programa Balança Mais não Cai. |
"Aqui a explicação do próprio Compositor Gilberto Gil. Publicada em seu site".
“Meses depois de solto, eu vim ao Rio tratar da questão da saída do Brasil com o Exército. Na manhã do dia da minha volta para Salvador, fui visitar Mariah Costa, mãe de Gal; ali, na casa dela, eu ideei e comecei Aquele Abraço. Finalmente eu ia poder ir embora do país e tinha que dizer ‘bye bye’; sumarizar o episódio todo que estava vivendo, e o que ele representava, numa catarse. Que outra coisa para um compositor fazer uma catarse senão numa canção?
“No avião mesmo eu terminei a música, escrevendo a letra num papel qualquer, um guardanapo, e mentalizando a melodia. Tanto que é uma melodia muito simples, quase de blues; como eu não dispunha de instrumento, tive que recorrer a uma estrutura fácil para guardar na memória. Quando cheguei à Bahia, eu só peguei o violão e toquei; já estava comprometido afetivamente com a canção.”
“Aquele abraço, Gil!” – “Era assim que os soldados me saudavam no quartel, com a expressão usada no programa do Lilico, humorista em voga na época, que tinha esse bordão. Ele até ficou aborrecido com a música; achou que deveria ter direito à canção. Mas eu aprendi a saudação com os soldados. Eu não tinha televisão na prisão, evidentemente, mas eles assistiam o programa; eu só vim a ver depois, quando saí.”
Retificação ratificada – Não foi no quartel de Realengo que Gil e Caetano ficaram presos, e sim no de Marechal Deodoro. “De todo modo”, diz Gil, “a idéia em Aquele Abraço era citar um local qualquer da zona norte do Rio (onde ficamos), um daqueles beira-estrada-de-ferro (Beira Central, Beira Leopoldina), e Realengo é um deles. Uma associação inexata, feita por aproximação; eu nem queria me referir ao lugar certo onde havia ficado preso.”
Uma canção de quarta-feira de cinzas – “O reencontrar a cidade do Rio na manhã em que nós saímos da prisão e revimos a avenida Getulio Vargas ainda com a decoração de carnaval foi o pano de fundo da canção. Na minha cabeça, Aquele Abraço se passa numa quarta-feira de cinzas; é quando o ‘filme’ da música é em mim mentalmente locado.”
The three tops – “Aquele Abraço é uma das músicas minhas mais populares, a mais tocada e o segundo mais vendido dos meus discos (compactos). Uma das três gravações minhas que ficaram em primeiro lugar nas paradas de sucesso durante maior tempo (dois meses; eu já estava na Europa). As outras são Xodó (três meses, em 73), da autoria do Dominguinhos e Anastácia, e Não Chore Mais (cinco, em 78), versão que fiz para uma música cantada pelo Bob Marley. Foram as três mais vendidas também.”
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Você sabe o que significa REALENGO? Qual a origem desse estranho nome? Dom Pedro I costumava ir para a fazenda de Santa Cruz pela estrada Real de Santa Cruz, que passava pelo Real Engenho, onde muitas vezes pernoitou. "Engenho" era uma palavra muito grande. Assim a abreviatura usada era "Engo". E ficou "Real Engo" nas placas de orientação utilizadas na época. Mas essa teoria é contestada por Brasil Gerson em "História das Ruas do Rio". Na página 405 da 5ª edição deste utilíssimo livro encontramos: "Não são poucos (e alguns de alta categoria intelectual) os que pretendem ver em Realengo um diminutivo, uma abreviação de Real Engenho. Porém, o manuseio dos documentos antigos, dos pedidos de sesmarias, principalmente, nos convencerá de que essa é uma teoria sem fundamento nesse particular, tal a insistência com que neles se fala de terrenos e campos realengos, destinados à serventia pública, e em maior número para a pastagem do gado por parte dos que não possuíam para isso terras próprias, e esses campos eram tanto onde ficaria sendo o Realengo dos nossos dias como perto da Igreja de Irajá, onde já os antepassados do Juca Lobo da Penha e outros criadores haviam protestado por causa de uma sesmaria dada a Manuel da Costa Figueiredo em terras que não podiam deixar de ser realengas..." Consultando o Aurélio: REALENGO - Bras. RS Sem dono; público. Em desordem; entregue às moscas; abandonado: Saiu, deixando o escritório ao realengo. [Do lat. vulg. *regalengu.]
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Aquele Abraço
J. Carino
Atravesso o Rio como numa aventura. Deixo para trás uma cidade emparedada e me lanço em direção ao subúrbio. A Avenida Brasil me cobra uma pressa que eu não teria; me obriga a navegar rápido num mar de automóveis; não me deixa olhar com vagar essa estranha transição entre dois mundos que convivem na mesma cidade.
Aos poucos, a luz muda, a paisagem se transforma. Os prédios aglomerados cedem lugar às casas, essas singularidades arquitetônicas hoje cada vez mais escassas. E, no subúrbio, resiste-se à ditadura de uma homegeneização arquitetônica: uma puxadinha aqui, para abrigar mais um parente, um andar a mais para acolher a filha que casou…
Muitas casas, moradias eternamente inacabadas, em que a falta de emboço escreve nos tijolos aparentes a história da permanente falta de dinheiro.
Chego ao meu destino: Realengo. Na larga avenida, os muros altos e compridos a não mais poder escondem os quartéis, lugares sérios e proibidos ao menino que só queria não perder sua pipa ou seu balão.
Sim, ainda há pipas e balões no subúrbio. Essa humanidade profunda contida nas brincadeiras infantis; no cansaço nunca sentido depois das longas “peladas” jogadas em campinho de várzea; no sabor da fruta madura roubada dos quintais; no cheirinho que sobe depois da chuva nas ruas de terra – tudo isso está lá em Realengo, convivendo com o progresso, que invade, célere e inevitável, os redutos suburbanos.
Lá estão as moças bonitas, o papo no bar da esquina, e essa figura tão rara em outros cantos da cidade: o vizinho. Está lá esse ser da casa ao lado, da mesma rua. Esse alguém que empresta ovos e açúcar; que ajuda no mutirão da construção da casa. Essa pessoa que vai entrar na família, virando compadre, virando nora ou genro, chegando e ficando para sempre, dando alma e corpo à amizade.
Realengo está lá, e vale a pena saber que os bairros lá estão, cheinhos de gente muito boa, cuja pele sua no trabalho como escorrem as gotas na garrafa da “loura gelada”.
Volto de alma nova. E cantando com o Gil: Alô, alô, Realengo! Aquele abraço!